sexta-feira, 21 de maio de 2010

ओ “GORPE”

E como dizem, toda família tem uma ovelha negra, um bêbado e vários loucos... Algumas têm até demais.





O
“GORPE”








BASEADO EM FATOS REAIS















BETHO RAGUSA


2008

O “GORPE”


Cenário:


No centro da sala há uma estranha fruteira onde há apenas um limão e uma cebola, há também sacolinhas, e saco de papel pra fazer fumo. Um sofá precário e uma mesa de bar com três cadeiras ambientalizam a casa, pois se trata de apenas dois cômodos.


Personagens:

Val: 37 anos, eletricista e radialista atualmente desempregado, alcoólatra, e vive de bicos, mas com eles mal consegue pagar a pensão alimentícia de sua filha. Bem humorado e cheio de artimanhas. Usa camisa xadrez, calça jeans, canivete pendurado no cinto preto, uma caneta, uma chave de fenda (teste elétrico) uma saquinho de fumo e palha, sapatão, cabelos encaracolados, barba mal feita.

Marina: 44 anos, tia de Betho, experiente e ótima companhia, é apaixonada por Val, mas ele a nega e nunca decide se estão namorando ou ficando. Consegue fazer de qualquer assunto sério, uma verdadeira piada. Faz observações absurdas de tudo, sempre tirando vantagem. Adora dar pequenos golpes em quem cair em sua rede. Calça de malha azul, blusa preta, usa óculos de sol como prendedor de cabelos o tempo todo, sempre carrega uma bolsa cheia de parafernálias, e também uma bolsinha pequena amarela, onde guarda seu dinheiro, jóias e o esconde entre os seios.

Betho: 18 anos, sonhador, comunicativo, trabalha como Office boy, e ganha apenas um salário mínimo, divide a casa com sua tia e o Val, que o extressa por não ter emprego fixo. Orgulhoso e detalhista naquilo que lhe interessa, reclama da bebedeira do Val, e do vício de fumar de Marina, porém adora estar com eles, e cai na onda fazendo as mesmas peripécias que eles. Usa óculos, calça jeans, camiseta e tênis, e sua mochila onde também carrega de tudo.

Pequenas participações: Dona Conceição (dona da casa, onde moram os três), Ladrão(aparece vestindo paletó), O garoto seqüestrado, Os três supostos compradores da casa, sendo um homem e duas mulheres.











Cena 1

Betho(remexendo contas): Vão cortar a luz...

Val (servindo uma dose pra beber): O que eu tenho com isso?

Marina: Ele trabalha na Elektro.

Val: Eu sou eletricista, e não trabalho na Elektro!

Marina: Aliás, você deveria estar trabalhando pra ajudar a pagar as contas.

Betho: Verdade Val, me desculpe se eu estiver falando demais, mas você sabe que sou sincero...Mas o que eu e ela ganhamos, mal dá pra comer, tem dois meses de aluguel atrasado e logo a D. Conceição vai dar despejo ou descarga, fora a comida... Você nunca deu nem um pacote de macarrão aqui em casa!

Val (resolvendo tudo): Manda a velha pastar... E quanto a comida a gente sai por aí e faz um charque, quanto ao pacote de macarrão, os últimos trocados eu comprei essa garrafa de pinga e já está no fim.

Betho (triste): Que vergonha Val, eu não tenho coragem de pedir nada pra ninguém, por enquanto.

Val: Se o motivo for vergonha, é só ir pra outra cidade...

Betho: Se não temos dinheiro pra comer, que dirá pra pagar passagem...

Marina: Nós pedimos na prefeitura, na agente social.

Val: Ou começamos a vender as coisas.

Marina: Vender o que? Não tem nem o que comer, não tem geladeira, nem mesa decente, essa aqui foi emprestada do bar da esquina, estamos sem TV... o que nos resta vender? (os dois olham para o Betho).

Betho: O ferro não, uso ele pra passar roupa! (Marina fica aterrorizada)

Val: Ainda bem...

Marina: Uma perguntinha: Onde você guarda o pinico e o bule?

Betho: Eu não uso pinico tia...

Marina: É um supositório...

Betho: Bom, se eu tivesse pinico, guardaria ele debaixo da cama e o bule debaixo da pia.

Marina: Então sua casa é organizada. (olha para a fruteira, Val a acompanha) Tirando a fruteira, isso é “uó do borogodó”.

Betho: Grossa!, deixe ela aí, ela gosta de ficar em meio a sala, ela se sente importante...

Val: Já eu se tivesse um pinico, colocaria ele na cabeça como capacete, porque qualquer hora essa casa vai desabar. E eu juro por essa luz que está iluminando (apaga) (...) Estava iluminando até agora... (batem na porta, o homem da luz com a autorização de corte, Betho vai atender).

Marina: Quem será, deve ser alguma cobrança. Dinheiro é que nunca trazem na porta da casa da gente....

Betho (retornando): Tia...o que a senhora fez com o dinheiro que eu dei pra pagar a luz mais atrasada?

Marina: Eu paguei a água mais atrasada, senão vamos ficar sem água e com o troco eu comprei velas pra garantir, pelo menos não ficamos no escuro!. Agora só falta acabar o gás.

Val: Qualquer coisa a gente pede emprestado do vizinho. Aliás, vou lá agora mesmo (pega o alicate, a fita isolante e sai).

Marina (sondando): Ele vai pedir obrigatoriamente, está levando o alicate pra entortar a boca do vizinho e a fita pra tampar a boca dele caso ele grite, ou será que ele vai vender o alicate pra comprar o gás?

Betho: Ah tia, deixe ele pra lá, estamos sem comida. Qual o cardápio de hoje?

Marina: Olha, a mãe do Val convidou a gente pra comer lá qualquer dia, nós vamos hoje. Aí aproveitamos e embolsamos algo pra janta. Olha o “gorpe” aí... (a luz acende).

Betho: Nossa!

Marina: Um milagre!

Val (entrando): Eis aqui o milagre...

Betho: Você é um castigo. Mas o que aprontou dessa vez?

Val: Fiz um gato na força do vizinho.

Betho: E o gás?

Val (entregando uma garrafa vazia fechada): Está aqui dentro, ele emprestou o suficiente para fazermos uma sopa leve.

Betho: Tia, cadê aquele óleo pra passar em queimaduras...

Marina: Vai besuntar o que? A língua?

Betho: Não a garrafa.. e vou introduzi-la no (...) do Val, e acender um fósforo pra ver se ele explode! (se livra da garrafa).

Val: E então, o que vamos comer?

Betho: Eu sei o que vou comer.. (prepara seu lado da mesa e pega uma lata de sardinha).

Marina: Eu não acredito que você não vai dividir a sardinha com a gente! Grosso!

Betho: Quem mandou vocês gastarem em cigarros e bebidas... (para Val) e você, e os bicos que você diz que faz, cadê o dinheiro?

Val: Ochiii, paguei a pensão da minha filha, e o seu Zé da padaria da esquina.

Marina: Mas o que você gastou lá na padaria que aqui não veio nada...nem um lanchinho pra disfarçar...

Val: Como não? Você é que não lembra...

Marina: Eu tô com “amenésia”. O lanche tava tão bom que eu entrei em delírio.

Val: E aquele saco de pão que eu trouxe?

Marina: Aquele pão amanhecido, ele teve coragem de cobrar por aquilo? (enquanto eles discutem um ladrão invade a casa).

Val: Vá de retro... É um ladrão de verdade?

Betho: Mas há essa hora? Antes só assaltavam de madrugada...

Marina: Horário de verão, hora extra.

Ladrão: Calem a boca, eu não tenho tempo a perder com conversa fiada. (aponta a arma para o Betho).

Betho: Porque eu? Eu vou ser o primeiro da chacina? Tenho direito a um último desejo...

Ladrão: O que?

Betho: Deixe eu comer minha sardinha, hummm só está faltando uma champagne, mas pode ser aquele suquinho de quinze centavos, eu posso ir ali no bar comprar (tira os quinze da carteira) ou o senhor pode ir buscar pra mim?

Ladrão: Passa a mochila! (começa a tirar coisas em abundancia: coelho, cartola, pomba, cobra, cueca, calcinha, sutiã, peruca, vestido, lata de ervilha, lata de milho).

Marina (com a mão na lata de milho): Escondendo o ouro...

Ladrão: Onde, cadê o ouro...

Marina: Aqui, (mostra as latas de alimentos) que grosseria sem fim...

Ladrão: Nada disso me serve, nem tem valor...

Val: A lata de ervilha e de milho pra gente tem um valor inestimável...Sr. Ladrão.

Betho: Eu faço teatro, pra mim isso tudo serve...

Ladrão: Hoje é dia cinco, passa o seu salário aí... Meu camarada!

Betho: Eu recebo dia dez.

Ladrão: E o décimo terceiro? Saiu a primeira parcela já... ,mê dê a primeira parcela aí!

Betho: Eu recebo tudo no dia vinte. (o ladrão fica desanimado, vira para o lado do Val).

Ladrão: E você? (revistando, não encontra nada)

Val: Oh, não aperta aí. Sr. ladrão, por favor, me arrume um cigarro?

Ladrão (dá a arma pra ele segurar, pega um cigarro, lhe entrega e o Val devolve a arma).

Val: Aí, a ferramenta de trabalho do senhor...

Marina: O Sr.arruma um pra mim também?

Ladrão (lhe dá o maço, antes entrega a arma ao Val para ele segurar novamente e ele a admira sorrindo).

Marina (rouba quase todo o cigarro do ladrão e devolve o maço com apenas um cigarro).

Val: Aí senhor... sua ferramenta de trabalho.

Ladrão (nervoso): Pára de chamar a minha arma de ferramenta. Você também não tem nada que merda! (vai até a Marina).

Ladrão: Agora a senhora.

Marina: Ah, um homem me revistar, nada disso, cadê a ladra feminina, eu tenho direitos...

Ladrão: Então vá tirando a roupa, anda! Anda! (ela obedece, mas consegue dar um jeito de não mostrar o cigarro e sua bolsinha onde guarda o dinheiro).

Betho: Que vexame, credo tia, a senhora sem roupa é um dragão, tudo flácido, tudo mole...

Marina: Paga um spa, ah que miséria...

Ladrão: Miseráveis, sem grana. Mas vou dar um jeito nisso vou levar os dois embora!

Betho: Não! Leva ele!

Ladrão: Chega de babaquice, eu mando aqui, bando de malucos! Eu resolvo o que fazer...

Val: Concordo com você. Tem que levar esses dois.

Betho: Grosso!

Marina: Leva ele, tira ele do nosso caminho...

Val: Como? Se não fosse eu, vocês estariam no escuro!

Ladrão: Cala a boca! Quer saber... Passa a sardinha!

Todos (protegendo a lata): O que? A sardinha não!

Ladrão: Eu preciso levar algo valioso, manter a dignidade de um ladrão.

Val: Concordo! Seus “malagradecidos”, eu faço de tudo pra vocês.

Marina: Dignidade? Tirar da boca de quem tem fome, isso é uma covardia...

Ladrão: Cala a boca!

Marina: O senhor não tem outra fala. Seu texto está muito repetitivo, está parecendo figurante de novela que só aparece por alguns segundos...Cala a boca, cala a boca!

Ladrão: Cala a boca! (sai correndo, levando a sardinha).

Betho: Droga, ficamos sem almoço...

Marina: Pelo menos roubei o cigarro dele. Bom, ainda podemos comer na mãe do Val... o que acham?
Betho: Boa idéia, só nos resta isso.

Val: Mas será que adianta ir lá? (levantam)

Betho: Não custa tentar... (se levantam, Dona Conceição grita a Marina lá fora, Betho e ela correm e se escondem e Val vai atendê-la).

D. Conceição: Cadê os dois meses de aluguel... Cadê a Marina?

Val: Não sei, não está comigo. Eu podia jurar pra senhora, eles estavam aqui.

Marina: Olha D. Conceição, o dinheiro estava aqui. Mas se a senhora sair por ai e ver um homem com uma lata de sardinha, ele é que está com seu dinheiro, vai atrás. Eu fui roubada...

D. Conceição: Como assim?

Marina: O ladrão levou tudo. Eu estou indo na delegacia fazer um O. B.

Betho: Tia, é B.O.

Marina: Ah, enfia o B. O. no (...)

Betho: Não, aí sim é o O.B... (vão saindo)

D. Conceição: Voltem aqui, vocês vão ver, eu vou despejar vocês, vou por a casa a venda... Bando de inúteis.



Cena 2


(Chegam todos da rua).

Betho: Sobrou somente o abridor pra contar história. (entra o ladrão novamente).

Ladrão: Me emprestem o abridor, não tenho nenhum.

Marina: Agora não tem mais história pra contar.

Val: Aceita um gole de cachaça?

Ladrão: Eu nunca bebo, quando estou trabalhando...

Val: Eu nunca trabalho, quando estou bebendo...

Ladrão: Boa, boa! Mas que bobagem, eu aceito sim.

(começa a bebedeira, papo vai, papo vem).

Marina ( a parte): Olha o “gorpe”...(o ladrão tira o paletó e coloca em cima do sofá).

(Betho tenta pegar a sardinha de volta de dentro do paletó, mas é em vão, então Marina o veste disfarçadamente para isso, aos poucos eles vão ficando bêbados, Marina pode tentar consertar dançando “La isla bonita” para atrair a atenção deles enquanto Betho pega o paletó e num deslize cai em meio a sala.).

Marina: Acode... a minha árvore de natal caiu... Lá se vai tudo por água abaixo..

Betho (sem rumo): Ho Ho Ho O natal chegou...

Marina: Cala a boca!, quer estragar o plano...(os dois acabam dormindo, e Betho se desfaz do disfarce).

Betho: Agora eu sei como um árvore de natal se sente, principalmente quando tem uma estrela enfiada no..., ai.. doeu...Trouxe a corda e a fita?

Marina: Claro.

Betho: Mãos a obra! (amarram os dois). Tia, tem algo estranho nesse gorpe. (olham).

Marina: Vamos sair daqui (tira tudo do paletó do ladrão).

Betho: Tia amarramos nosso aliado!

Marina: Ladrão que rouba ladrão tem cem anos de perdão. (vai saindo, Betho a interrompe).

Betho: Não, volta aqui. A D. Conceição pode chegar, e se ver os dois aqui vai achar que demos o “gorpe” até no Val.

Marina: Lá se vai o sonho de gastar o dinheiro sozinha. (desamarra o Val, mas como ele dorme, colocam ele no sofá).

Betho: Agora temos que dar um fim no ladrão... (pensam) Tia, está pensando o mesmo que eu?

Marina: Temos que pensar direito. Onde foi que pusemos a corda? (encontram-na e Marina busca uma cadeira com rodinhas, eles amarram a corda nela e colocam o ladrão, Betho sai pra fora e amarra a outra ponta na traseira do caminhão, e volta. O caminhão parte e logo após freia)

(D. Conceição grita pela Marina, ambos correm e se escondem).

Marina: Estamos escondendo de quem?

Betho: Da polícia!

Marina: Não fiz nada, infelizmente o caminhão freou e não sabemos o que aconteceu. Da porta pra fora não me responsabilizo mais, ele saiu vivo daqui. (D. Conceição entra nervosa).

Marina: Aqui está (entrega) metade do que devemos, é o que temos pra dar.

D. Conceição: Pelo menos alguma coisa, olha ali, dinheiro pra pagar aluguel é difícil, mas para se entupir de pinga... até cair.

Marina: Pelo menos eu paguei metade da dívida, e pra se entupir de pinga não precisa de dinheiro, agora pode devolver se quiser, eu faço despesa, meu armário está vazio.

D. Conceição: Quanta petulância...e tem mais, a casa será vendida, e em breve os supostos compradores irão visitar a casa.

Marina: Há há há, quem vai se interessar em comprar uma casa que o banheiro fica três casas depois, chove lá fora a gente tem que por uma barca aqui dentro, fora os bichos de estimação, ratos, camundongos e gafanhotos...

D. Conceição: Até agora tem servido bem, não é? Já basta.

Marina: Se depender de mim, não será vendida, eu não sairei daqui!

D. Conceição: Veremos!

Marina: Vamos até a casa da Terezinha ver se ela tem algo pra gente comer (saem).


Cena 3



(Val acorda e percebe estar sozinho).

Val: Onde está meu amigo ladrão? E cadê os dois gorpistas! Foram roubar junto com ele, e se aquela megera vier cobrar o aluguel. Preciso de dinheiro rápido (sai correndo e volta com um moleque amarrado e o coloca sentado).

Marina e Betho (voltando, se assustam com a cena): Val o que é isso?

Val: Uma criança, não estão vendo?

Betho: Grosso! E o que ele está fazendo aqui?

Val: Eu seqüestrei ele, e vou pedir resgate.

Betho (para Marina): A senhora já está preparada pra conhecer a penitenciária de Águas da Prata?

Marina: Água eu já tenho, eu paguei a conta lembra? Prata eu encontro em loja. Eu não seqüestrei ninguém.

Val: Chiu... Vou ligar pra pedir resgate...

Betho: Fecha a porta tia.

Val: Boa tarde senhora, estou ligando pra dizer que seqüestrei seu filho. Como assim? A senhora já ouviu falar em seqüestro por telefone? (para os dois) acho que ela não está entendendo...

Betho: Espere aí (vai para o quarto e volta com uma chapa de raio x) Fale novamente...

Val: Senhora, obrigado por aguardar na linha, como eu dizia seu filho sofreu um seqüestro relâmpago (Betho chacoalha) Entendeu? Estou ligando pra negociar, ahn? Quanto que a gente quer de resgate?

Val (acena questionando)

Marina e Betho(mostram cinco dedos).

Val: Cinqüenta centavos! (o menino não acredita, Betho e Marina se retorcem). É cinqüenta centavos minha senhora, não ouviu... A senhora é surda?

Betho: Pede um minuto pra ela...

Marina: Cinqüenta centavos, você está pedindo pra comprar doce para o moleque?

Betho: Estamos devendo duzentos reais de aluguel, o que vamos fazer com cinqüenta centavos?

Val: Aumento para dois e cinqüenta , minha senhora.

Betho (furioso): O que você vai fazer com dois e cinqüenta Val?

Val: Um minuto minha senhora (para Betho) vou comprar uma garrafa de cachaça e umas balinhas para o garoto!

Marina: Ah não, há essas alturas do campeonato, você com brincadeirinha, dois e cinqüenta num seqüestro relâmpago (Betho chacoalha).

Val: Daqui a pouco eu ligo novamente senhora, mas permanece nos dois e cinqüenta. (desliga) vocês ficaram sabendo, aqui na rua de trás uma cadeira com rodinhas se chocou contra a traseira de um caminhão.

Marina: Doeu...

Val: Se doeu? Estava todo mundo entretido no acidente, corpo de bombeiros, policia, funerária, carrocinha, pipoqueiro, até um carrinho de cachorro quente tinha, aí que peguei o menino, foi relâmpago.

Betho: Agora doeu...

(Palmas da rua, os supostos compradores chegam).

Betho: Sujou! Devem ser os compradores que a D. Conceição comentou... Temos que pensar em algo rápido (palmas) Tia, a senhora recebe eles normalmente, é só a senhora prestar atenção na cena que tudo correrá bem, não podemos deixar eles gostarem da casa.

(Val joga sonrisal na boca e Betho traz um lençol branco e joga em cima do garoto, e eles começam a fingir que são loucos).

Marina: Podem chegar, oh, esse é meu sobrinho. Triste destino o levou a cometer alguns atos contra si mesmo, o último foi arrancar os testículos com uma tesoura, ele também sofre de alucinações e quando se agarra na perna de alguém é difícil de largar. (vira para o Val) E esse é meu paciente preferido, ele ficou louco depois de ser obrigado a dirigir uma van cheia de lobisomens que tinham que percorrer sete cidades, vocês sabem como é ne? Lua cheia... E também essa casa é mal – assombrada, a noite, vozes e gritos são ouvidos por toda parte.

Comprador : E o que é isso debaixo do lençol...

Marina: Isso? Isso é... ah, um amigo ele é psicótico, sofre de mal de agudos, não pode ficar muito exposto na luz, (destampa, o garoto grita, tampa o garoto pára de gritar, Marina usa isso como forma de chamar a atenção dos compradores).

Compradora: E você cuida dos dois? Mas a dona da casa disse que vocês eram todos um bando de desocupados (Marina avista a garrafa de pinga e corre pra esconde-la).

Marina: As pessoas se enganam...

Val: Oh... Eu preciso me concentrar no que estou fazendo. Vou dirigir uma van essa noite...

Betho: Estou a procura de outro testículo... (vai atrás do comprador)

Comprador: Cruzes! Eu particularmente acho que essa casa é pequena querida, vamos encontrar outra.

Betho: Eu preciso de um testículo novo.

Val: Senhores passageiros esta noite, a passagem terá desconto até a uma da madrugada...

Compradores: Verdade, vamos dar o fora daqui (saem correndo).

Todos (comemoram).

Betho (soltando o garoto): Vai filho, volte pra sua casa.

Garoto: Eu quero ajudar vocês num “gorpe”. Vocês deixam...

Betho: Cresce primeiro belezão...vai vai... some, antes que sua mãe traga os dois e cinqüenta e eu enfie no nariz do Val...

Marina: Só nos resta pensar em outro gorpe.

Betho: Aquele da vidente... Como funciona mesmo?

Marina (conforme conta, joga os apetrechos na frente dos dois): É só cobrar sete velas de cada cor, sete pacotes de cigarros e sete garrafas de pinga, aí dizemos que a vida da pessoa está tudo errado e que enquanto não fizer esse descarrego nada dará certo. Cobra-se um absurdo e a pessoa paga, porque o psicológico está abalado sabe... Uma mulher fez isso e ficou rica, rancou dinheiro do povo e sumia na poeira, era tudo mentira...

Betho: E o que ela fazia com a vela, as garrafas de pinga?

Marina: Aceita uma sugestão, vira aí que eu te mostro...

Betho: Grossa!

Marina: Grosso!

(sentam no sofá)

Betho: Porque estou sentindo um vazio tão grande?

Marina: Porque você não está cheio.

Val: Gente o que temos para comer?

(Betho se lembra da sardinha em cima da mesa, começa a assoviar e levanta, Marina também finge que vai arrumar algo, e Val finge estar de olho na fruteira).

(e finalmente correm até a sardinha que brilha feito um tesouro em cima da mesa)

Todos: Peguei! Continua (...)



GORPE II

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